segunda-feira, 30 de maio de 2011

Semana 1 - Parte 2 de 2 - Do nascer da vontade

Miu miu, meu gatão!

Foi no Domingo á noite que percebi que não havia, por coincidência, comido carne durante o fim de semana inteiro. A segunda passou-se tranquila - junto ao namorado praticamente o dia todo, não foi complicado não comer carne. Foi apenas na Terça-Feira de tarde que a idéia de que querer ser vegetariana tomou forma de verdade. Prestes a ir dar aula para a turma de 12:15, pensei nas opções de almoço que eu teria próximas ao meu trabalho. Financeiramente inviáveis. Apenas restaurantes mais caros priorizam opções de salada.

A verdade é que somos uma sociedade que gira em torno da "mistura". Vocês já repararam que quando se pergunta o que há para o almoço, em geral a resposta é o tipo de carne que está dando sentido ao prato? Os demais alimentos são tratados de forma completamente secundária, como se apenas a carne, e apenas ela, fosse dar a energia necessária para ser considerado um almoço. Pensando nisso, sem saber como explicar para a moça da marmitaria que eu queria arroz, feijão, macarrão e salada, sem "mistura", resolvi apelar para um Kalzone de brócolis. O resultado foi fome e dor de cabeça. Um Kalzone não é capaz de alimentar quem está acostumado a comer "comida de panela" no almoço, seja ele com carne ou sem carne. Aprendi minha lição da pior forma e mesmo comendo no meio da tarde pão com café, nada fazia a dor de cabeça ir embora. Associo também uma boa parcela da dor de cabeça ao psicológico.  Como tudo na vida, se você der importância demais, vira um problema. Tentar mudar seus hábitos alimentares da noite para o dia certamente vai modificar sua rotina, mas é necessário lembrar que a comida é apenas parte da sua vida, não é a parte mais importante, nem de longe. Até então, não havia contado para ninguém dos meus anseios vegetarianos, mas à noite não resisti e dividi com o Val. Ele me apoiou, mas não mostrou muita empolgação no telefone. Ele tem medo que seja apenas por influência dele que eu tenha tomado essa decisão.

Na quarta, fui almoçar em um restaurante hare krishna. Quer dizer, tentei. O restaurante estava fechado e eu tinha pouco tempo. Tive que almoçar em um shopping e foi um self-service caro que aplacou minha fome. E nem mesmo nele fui plenamente feliz: quase todas as saladas levavam presunto e catar a cebola das saladas já é tarefa difícil o suficiente.Preciso conhecer os lugares e as manhas dos locais frequentados pelos vegetarianos ou é já já que vou á falência! Á noite, com fome, lavei a burra no Habbib's. Comi três bolinhos de bacalhau e tomei a decisão de comer peixe no máximo uma vez por semana, caso dê vontade. Estou me tornando vegetariana por vontade própria, ninguém está me obrigando, não tenho problemas graves de saúde e nem uma religião que me imponha o vegetarianismo como necessidade. Abrirei a exceção de um dia caso eu tenha vontade. E assim o fiz, sem culpa.

Na quinta tive comidinha preparada pelo namorado, mas só pude comê-la às 4 da tarde (trabalhando loucamente tem hora que nem almoçar dá). A comida estava maravilhosa. Comer em casa, comer comida de casa faz uma diferença imensa - na rua, por mais temparadinha que a comida seja, tudo tem gosto de panela grande. Vocês entendem o conceito de panela grande? Comida de festa, comida feita em quantidade, para muitas pessoas e por muitas pessoas é tão diferente da comida preparada para duas ou quatro pessoas! Talvez seja o carinho, talvez as pequenas quantidades, não sei. A verdade é que tem uma hora que comida de restaurante dá nos nervos. Á tarde, me dei de presente uma sessão torturante de vídeos do Peta sobre como os animais sofrem para virem aos nossos pratos. Eu não precisava vê-los, até porque já havia os visto. Mas dessa vez, eles adquiriram um outro ar. Sinto como se dessa vez eu posso parar de fazer parte do grupo de pessoas que aceita calada, garfada após garfada, que seres vivos como eu e você sejam mortos para que nos alimentemos. Seres que são reproduzidos em escala, criados em ambientes terríveis e mortos sem piedade e muitas vezes com muita, muita crueldade. Nós não precisamos da carne que comemos e só por ser de um animal irracional, não significa que não é carne. Ao ver vídeos como os do Peta, penso nos meus gatos. Sempre tive gatos ao meu redor e sempre os tratei como filhos. Minha gata Maggie me massageia quando estou doente, o Miu-Miu sabe quando eu estou triste e me procura muito mais quando eu preciso de companhia. São constatações que apenas quem tem gatos ou mesmo cães em casa sabe - por mais que os animais domésticos sejam extremamente interesseiros (assim como nós também somos), há nos animais uma pureza que nos falta, eles percebem e possuem sentimentos, pensam e agem, seja com amor ou ódio. Há quem tenha galinhas de estimação, vacas, ratos. Não há diferença entre um animal de estimação e uma vaca pastando em um sítio. Pensar nisso e pensar nos meus gatos e ver os vídeos e refletir sobre eles me fez chegar à conclusão que nenhum sacrifício meu, seja de almoço ou jantar, justifica a retirada da vida de seres vivos como eu, meus gatos ou a vaca que nos é servida com rodelas de cebola refogadas todos os dias. Após essa experiência, encarei uma festa de aniversário à noite sem dramas. Festas de aniversário são terríveis testes - as coxinhas parecem cantar como sereias te seduzindo....só um vai, só uma. Raspei o frango de uma delas e fui feliz com o bolo e os amendoins presentes. Foi incrivelmente tranquilo.

Sexta, namoradiei de novo. Analisando bem, eu comi demais na casa do Val durante a semana. Mas isso foi bom, é bom ter um lugar onde não se pergunta por que você está rejeitando as almôndegas. Como a prima dele é vegana e ele vegetariano, as pessoas da casa já naturalizaram o vegetarianismo e o mercantil feito todos os meses contempla perfeitamente tudo que um vegetariano precisa. E o mais interessante - um onívoro também. Convivem na casa dele onívoros e carnívoros sem nhem nhem nhem de nenhuma das partes. É um mundo ideal, bem ideal.

Meu real teste foi durante o fim de semana. Em comemoração ao aniversário do Val, fomos à Canoa Quebrada. Praia, sol, mar.....frutos do mar. Frutos do mar! Sou louca por eles, camarão, caranguejos...Como resistir? Como vou conseguir? Simples. Ao chegarmos na cidade e buscarmos um local para almoçar, não foi difícil desviar-me dos pratos sugeridos (Buchada, Sarapatel...). E foi entre uma garfada e outra de uma comida deliciosa e um ovo frito sob o olhar desconfiado da garçonete que nos surgiu um pescador vendendo arraias recém-abatidas. Eu não vi a sacola, tentei nem ver, mas o Val viu e descreveu como uma coisa sangrenta dentro de uma sacola. Começamos a refletir sobre o quão primitivo é ter um cadáver recém-abatido sendo oferecido à venda. Se fosse queijo, seria apenas queijo, não haveria sangue. Foi daí que o nome do blog veio - queijo não sangra. Eu sangro e você sangra, assim como todos os demais animais que insistimos em comer. Após a arraia, foi tranquilo. E na noite do sábado comemos uma das melhores pizzas mussarela da minha vida. Sabe aquele queijo gratinado no ponto certo? Aquela pizza fininha com molho de tomate docinho? Pizza de propaganda, pizza dos sonhos. Comi a pizza sem nem lembrar da tentativa de ser vegetariana, ciente de que as próximas semanas não vão ser tão difíceis assim.

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