segunda-feira, 25 de março de 2013

Comemos realmente o que queremos comer ou o que nos mandam comer?





A mudança na minha alimentação está sendo lenta, mas eficiente. Tornar-me vegetariana foi o primeiro passo e sequer foi por saúde. Só que, como vivemos em uma sociedade na qual jamais questionamos o que comemos ou de onde vem nossa comida, uma mudança como cortar a carne do cardápio pede adaptações, e precisei entender um pouco mais sobre os grupos alimentares. Comecei a pensar no que colocava no prato e como a comida afetava meu corpo. Desse ponto em diante, de tempos em tempos, uma mudança era feita.Incluí mais frutas e verduras, comecei a fazer combinações inteligentes, limitei o consumo de café a aumentei o consumo de chás, dimunuí a um nível mínimo o açúcar cristal e a farinha de trigo branca (substituindo por melaço de cana ou rapadura e farinha de trigo integral), parei de tomar refrigerantes, troquei os óleos de cozinha por óleos saudáveis (como óleo de côco e ghee), adaptei receitas fritas por cozidas em molho, no forno ou á vapor, incluí aveia e grãos germinados à minha alimentação e diminuí drasticamente o consumo de álcool. Ainda há muito o que ser feito e, aos poucos, vou realizando mudanças as quais muita gente julga impossível e sinto a imensa melhora em minha saúde todos os dias. Fiz todas essas alterações aos poucos.  Nada da noite pro dia funciona, principalmente quando se trata de comida. Simplesmente parar de comer chocolate vai te deixar com uma vontade alucinada de comer chocolates e você não conseguirá pensar em mais nada a não ser chocolate - e essa frustração vai te levar de volta com força total para barras e mais barras de chocolate recheadas de culpa que nunca terão sido tão gostosas. Mas se você evitar, se te der um dia da semana para comer um pouco de chocolate, se buscar substituições mais saudáveis pra vontade de doce, gradualmente o chocolate vai deixar de ocupar um papel tão essencial na sua vida.


Comemos o que nos mandam comer. Deixamos de fazer escolhas alimentares baseadas no que precisamos, no que faz bem ao corpo, no que naturalmente previne e cura doenças. Deixamos nosso paladar ser completamente alterado e adaptado às vontades do mercado. Não é à toa que não gostamos de vegetais e frutas, sequer sentimos mais o gosto das coisas naturais. Nosso paladar pede gostos cada vez mais fortes, cada vez mais artificiais. Assim como um fumante que deixa os cigarros e volta a sentir aromas e sabores os quais o corpo era incapacitado de sentir, o mesmo acontece com os alimentos processados e com a carne. Após três meses como vegetariana, comecei a perceber o verdadeiro sabor de frutas e verduras. Comecei a entender suas particularidades e explorá-las. Um imenso leque de possibilidades se abriu exatamente onde eu achava que morava a limitação. Por não buscarmos ir além do óbvio, do que todo mundo come, do que é “normal”, nossa alimentação não consegue seu papel essencial – nutrir o corpo, munindo-o do que é necessário para manter seu bom funcionamento.



Diante da mera possibilidade de parar de tomar refrigerante, muita gente se apavora. "É impossível", "Eu jamais aguentaria", "Não consigo viver ser refrigerante" são apenas algumas das frases que leio quando compartilho um texto qualquer sobre como refrigerantes fazem mal à saúde. Criamos necessidades fúteis e as transformamos em itens vitais. Como alguém pode dizer que não viveria sem refrigerante? Em que ponto da nossa evolução nos deixamos tão facilmente nos viciarmos por coisas que apenas prejudicam nossa saúde? Qual o preço que pagamos por um prazer temporário e nocivo? Há quem diga que os refrigerantes são difíceis de largar por estarem em quase todos os lugares. Eu também acreditava nisso. Mas, depois que parei, os refrigerantes continuam ao meu redor, mas eu sequer reparo. Se vou a uma festa e só tem refrigerante, não tomo nada e não morro de sede pois primeiramente refrigerante não passa a sede, apenas a aumenta e segundo que sobrevivemos alguns dias sem água, quanto mais sem refrigerante. É difícil, sem dúvida, mas não é impossível. E reflita: se você se julga incapaz de parar de tomar refrigerante, é hora de pensar na dimensão de controle que você tem sobre si mesmo e o quanto do controle dos seus desejos está nas mãos de outras pessoas que não você.



quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Sobre como ficamos doentes segundo a Ayurveda


Venho estudando a Ayurveda há algum tempo e todos os dias me surpreendo um pouco mais com a diferença gritante entre esta ciência holística e a alopatia. Embora a alopatia seja imbatível no atendimento de urgências e emergências, ela deixa muito a desejar no aspecto da prevenção e cura definitiva de doenças, principalmente as crônicas. Muitos remédios alopáticos além de curarem apenas temporariamente o paciente (pois tratam a doença e não o paciente), ainda causam outras enfermidades devido aos efeitos colaterais dos processos químicos. Além disso, quem nunca ficou frustrado ao sair de uma consulta alopática rápida e superficial demais, com as mãos cheias de remédios e o bolso vazio?

Para a Ayurveda, a manifestação de doenças ocorre em seis estágios. Buscarei descrevê-los de forma bastante compreensível.

Para a Ayurveda, o segredo de uma vida saudável reside na digestão.
Shat Kriya Kal - Os seis estágios da manifestação de doenças

Sanchaya - O estágio da acumulação

O primeiro estágio do desenvolvimento de doenças é formação e acumulação de toxinas. Digamos que você  resolva jantar comidas de difícil digestão muito tempo depois do sol se pôr. Sem tempo e sem as ferramentas necessárias para digerir a comida àquela hora (já que o pico do poder digestivo é ao meio-dia), o corpo, ao invés de estar se purificando à noite, incomoda teu nome à noite inteira, fazendo com que você não consiga o tão necessário descanso. Ao acordar de manhã, você se sente pesado, letárgico e às vezes até nauseado. Não é para menos - a comida da noite passada não conseguiu ser digerida, ainda está lá no seu estômago literalmente apodrecendo e a náusea é a prova de que o corpo quer eliminá-la. Ao invés de jejuar durante a manhã para dar ao corpo o tempo que ele precisa para digerir aquela comida, empurramos mais alimentos para que o pobre estômago se vire para digerir, e ainda jogamos café e/ou alimentos gelados para piorar a situação. Mal-digerida e transformada em toxina, a comida vai para o intestino.

Prokopa - O estágio da agravação

Como não modificamos nossa deta e estilo de vida de forma a favorecer a digestão, continuamos a criar toxinas que vão se alojando nos intestinos. Ignoramos os gases, o inchaço, a náusea, quando não mascaramos tais sintomas com remédios alopáticos como anti-ácidos.

Prasura - O estágio da migração

O acúmulo de toxinas formadas pela comida mal-digerida no intestino se torna insuportável ao corpo e, ao processar os alimentos e retirar deles os nutrientes que serão espalhados pelo corpo, junto vão as toxinas. Nutrientes e toxinas são espalhados pelo corpo inteiro.

Sthana Samshraya - O estágio do aumento da doença

Ao achar um órgão com menos resistência, as toxinas se alojam. Ao se acumularem em uma área de baixa imunidade, as toxinas começam a prejudicar o funcionamento do órgão. Existem várias razões para a queda de imunidade de um órgão, entre elas influências congênitas, efeitos de dietas ruins, falta de exercícios físicos (principalmente aqueles que vão além do trabalho do músculo, tendo efeito nos órgãos internos, como a Yoga), efeitos de doenças anteriores, mudanças climáticas, poluentes químicos e radiação.

Vyakta - O estágio das manifestações sintomáticas

Nesse estágio, as toxinas que adoeceram os órgãos começam a mostrar seus efeitos. Todo o processo já citado torna o corpo incapaz de manter sua imunidade. É quando nos descobrimos doentes e vamos ao médico.
Bem longe de serem a solução.

Bheda - O estágio das complicações

Voltamos para casa repletos de remédios que  irão apenas mascarar os sintomas, ainda forçamos o corpo a lidar com os diversos efeitos colaterais de tais drogas os quais muitas vezes não possuem sintomas imediatos. A raiz do problema sequer foi diagnosticada. Quem pensaria que uma infecção urinária ou uma artrite têm origem na má-digestão de alimentos? Anos de alimentos má-digestão geraram tantas toxinas que o corpo depende dos medicamentos que cegamente consumimos para a manutenção de seu funcionamento. O corpo perdeu a habilidade de se auto-curar por não entendermos e nem respeitarmos seu funcionamento natural.



Como é possível concluir, somos os maiores responsáveis pela nossa saúde. Se conseguirmos modificar nossa alimentação e estilo de vida de forma a favorecer e não prejudicar a digestão, evitaremos o acúmulo de toxinas. Pequenas mudanças na rotina fazem toda a diferença como nos consumirmos alimentos facilmente digeriveis durante a manhã e principalmente durante a noite, deixando alimentos de difícil digestão para serem consumidos quando o corpo pode lidar com eles, ao meio dia. Evitar ao máximo o consumo de líquidos e frutas durante e depois das três refeições principais do dia evitam que a digestão seja prejudicada e, consequentemente, nos torna livres de doenças. 




quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Sobre meus 1 ano e 9 meses de vegetarianismo e a culpa da Índia


Ser vegetariano na Índia é só felicidade.


 É de se estranhar que eu tenha vindo para a Índia, o paraíso dos vegetarianos, e não tenha contribuído com um post qualquer para o blog. Foquei minha atenção ao outro blog, o Zevendim, no qual narro minhas aventuras no sub-continente. Peço perdão aos fiéis leitores e, humildemente, peço suas visitas, comentários e discussões de volta. Eis que o Queijo Não Sangra voltará a ser atualizado. Tenho plano de migrar os posts daqui para um outro blog que inclua minhas novas paixões: Yoga e terapias naturais. Assim que descobrir uma maneira viável de realizar a migração, avisarei a todos.

Comemoro 1 ano e 9 meses de vegetarianismo, dia 28 de Maio a comemoração será de dois anos. Muita coisa do meu corpo e na minha mente mudaram desde que percebi que havia passado um fim de semana inteiro sem comer nenhum tipo de carne e resolvi continuar assim. Boa parte dessas mudanças se deu pelo fato de ter me mudado para a Índia há 1 ano e meio. Não é à toa que chamam a Índia de "o paraíso dos vegetarianos".

O vegetarianismo da Índia é motivado pelos hindus, budistas e jainistas. Embora nem todo hindu seja vegetariano, a prática da não-violência (ahimsa) e a crença na reencarnação em qualquer ser vivo freiam o consumo de carne e muitas vezes até de leite e ovos. Para a Ayurveda, a medicina milenar da Índia, o consumo de carne não é beneficial ao corpo já que sua digestão é complicada e a ayurveda centra a saúde humana no aparelho digestivo. Os medicamentos da ayurveda são todos à base de plantas e raízes e não são testados em animais (diga-se de passagem, a ayurveda utiliza os mesmos medicamentos bastante eficientes há milênios, diferente da alopatia em que toda semana há um remédio novo e mais eficiente do que o anterior). Para a Yoga (desenvolvida pelo mesmo povo que desenvolveu a ayurveda, os Vedas) o consumo de carne dificulta a meditação e aumenta a propensão à raiva, à inquietação mental, pensamentos negativos e egoísmo. Os veganos são chamados de "pure veg". O interessante é que o vegetarianismo aqui vai até além do prato - chocolate, farinha de trigo, pasta de dente, shampoos, condicionadores, perfumes, remédios e uma infinidade de itens trazem em suas embalagens um símbolo. Se verde, o produto é completamente livre de qualquer item de origem animal e também não foi testado em animais. A presença do símbolo na embalagem dos alimentos é regida por lei e respeita o consumidor. Há uma infinidade de restaurantes exclusivamente vegetarianos. Além disso, todo restaurante possue uma área reservada do cardápio para pratos vegetarianos e , algumas vezes, até uma cozinha separada para o preparo desses pratos. Os utensílios da cozinha, da panela à colher, nunca foram usados para cozinhar carne. O respeito chega a esse nível.
Veg Thali, Em sentido horário: mix veg curry, coalhada, papad, salada fria, arroz, chappati e dal.


Então todo Indiano é vegetariano? Não, mas todos são bem menos onívoros que qualquer outro povo. Receitas vegetarianas são consumidas com maior frequência - em geral, um almoço non-veg acontece duas ou três vezes na semana. Além disso, como a refeição indiana é composta de vários itens, os itens onívoros são minoria. É senso comum que a comida vegetariana é mais saudável. Mesmo os muçulmanos, ávidos consumidores de carne vermelha, entendem e fazem uso da culinária vegetariana. Aqui não tem aquela história de perguntar para um vegetariano "então,o que é que você come?". Terra de especiarias, a Índia sabe como dar sabor aos vegetais mais desgostosos e possue pratos com itens comuns à nossa culinária, mas elaborados de forma completamente diferente.
Dosa...uma panqueca maravilhosa feita de arroz e lentinhas.  Acompanhando,  coconut chutnet,  aloo masala (batata) e sambhar.

Para mim, aprender sobre a culinária indiana foi um divisor de águas. Diminuí drasticamente o consumo de soja e tornei minha alimentação muito mais saudável. Produtos integrais custam o mesmo que os processados, como a farinha de trigo branca (maida) e a farinha integral (atta). É uma culinária que valoriza alimentos frescos, da estação, integrais, preparados na hora e de valor nutricional altíssimo. Até as especiaria,s utilizadas para dar um sabor e aroma irresistíveis possuem efeitos terapeuticos. Um bom exemplo disso é o turmeric (a tradução que achei foi "açafrão-da-terra)., que tem ação anti-inflamatória e antioxidante. Isso sem falar nos óleos utilizados nas receitas. Além dos inenarráveis benefícios do consumo de óleo de côco e de gergelim, a culinária indiana usa e abusa do ghee (manteiga clarificada, receita em breve), que não modifica suas propriedades mesmo em temperaturas elevadas e nutre o sistema nervoso, fortalece o fígado e os rins, equilibra a acidez gástrica, estimula o metabolismo, lubrifica articulações e ainda é uma delícia.

O sucesso das receitas vegetarianas é culpa das especiarias.


Nos próximos posts, detalharei minhas descobertas e compartilharei receitas que podem ser feitas com itens encontrados (ou produzidos facilmente) no Brasil. Espero contribuir para a saúde dos vegetarianos brasileiros e, porque não, dos onívoros também, afinal, diminuir o consumo de produtos de origem animal é perfeitamente possível para todos.